terça-feira, 23 de setembro de 2014


Quanto a mim dou graças
pelo que agora sei
e, mais que perdoo, eu amo.

Adélia Prado

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sexta-feira, 19 de setembro de 2014

...

(Porque, embora deva ser breve a nossa vida, é só enquanto sofremos que nossos pensamentos, de algum modo agitados por movimentos perpétuos e ondulantes, elevam, como numa tempestade, a um nível onde se torna visível, toda essa imensidão regida por leis, que, debruçados a uma janela mal colocada, não conseguimos avistar, porque deixa-a rasa e lisa a calma da felicidade; só para alguns grandes gênios tal movimento existirá sempre, independente da agitação da dor; não o podemos todavia afirmar, pois, ao contemplar-lhes o largo e regular desenvolvimento das obras alegres, inferimos, da alegria da produção, a da vida, talvez ao contrário constantemente dolorosa?)

Proust in: O tempo redescoberto. Tradução de Lúcia Miguel Pereira. Ed. Globo, p. 173.

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

a graça dos seres

- Você que ama tanto as coisas da inteligência... - dizia-lhe France.
- Não amo de modo algum as coisas da inteligência; só amo a vida e o movimento - respondia Proust.
Era sincero; a inteligência lhe era tão natural que ele nem valorizava seus jogos, invejando e admirando, isto sim, a graça dos seres de instinto.

André Maurois in: Em busca de Proust.Ed. Siciliano, p. 51.

terça-feira, 16 de setembro de 2014

Ouvir de novo, acreditar.


Na fita da secretária eletrônica, deixar só um recado. Ouvir de novo, acreditar. Nem precisa ser de verdade. Rosas vermelhas brilham no escuro da sala quase toda branca. Quando teu pensamento me chamou foi bonito.

(Caio F. in: A vida gritando nos cantos. Ed. Nova Fronteira, p. 145)

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quinta-feira, 11 de setembro de 2014

nada


Silêncio.
"O que você tem, meu amor?"
"Nada." Um nada, o segundo, cujo significado era, claramente: Não me venha com essa de "meu amor".

Philiph Roth in: A marca humana. Companhia das Letras.

quarta-feira, 10 de setembro de 2014

como


“Quando, em uma entrevista, me fazem a pergunta: ‘Como o senhor escreveu o seu romance?, em geral corto e respondo: ‘Da esquerda para a direita´.”

(ECO, 2003, p. 285)

terça-feira, 9 de setembro de 2014

Sabia que eu precisava terminar o que nem tinha começado

Preciso escrever, eu disse, com pompa, como um presidente da república que justificasse sua falta de tempo em atender às demandas de uma dona de casa, suas reclamações do gás de cozinha. Você sabe, eu preciso terminar isto aqui.
É claro que ela sabia. Sabia que eu precisava terminar o que nem tinha começado; que precisava começar. E eu, por meu lado, sabia também que ela não ignorava, por mais que este parágrafo fique truncado e confuso; eu sabia que ela não ignorava minha derrota cotidiana, meu fracasso diário, minha rendição incondicional à vida: eu entregava os sonhos como um condenado sob tortura entrega os cúmplices. A grande diferença, e ela tinha consciência também desse detalhe, é que eu me rendia, traía e entregava sem ter sido torturado.

Alexandre Marques Rodrigues in: Parafilias. Ed. Record, p.16-17.

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

dos sonhos

Você sabe do que estou falando, muitos de nossos sonhos não se concretizam; alguns, sim, outros caem num caminhão de merda, e essa é a natureza da vida, ganhar e perder, nascer e morrer, caminhar e correr...

Carlos Henrique Schroeder in: As fantasias eletivas. Ed. Record, p.59.

sexta-feira, 29 de agosto de 2014

da literatura


Pois é hora de pedir à literatura que se erga, que abandone a passividade, e que volte a ocupar o lugar que, de fato, lhe cabe; que renuncie ao divã e venha se sentar, ela sim, na poltrona do analista. Que volte ao barco de Hemingway, aos delírios de Virginia, ao escritório de Kafka, à cozinha de Adélia, ao balcão de Pessoa. Que volte a viver – e a dar as cartas. E que simplesmente esqueça de nós, intérpretes bem treinados, arrogantes com nossos títulos e nossas referências, interrogadores e investigadores profissionais. E que nós tenhamos a coragem de retomar nosso posto, mais humilde e mais perturbador, de leitores; que tenhamos a humildade, e mais que isso, a ousadia, de deitar no divã, deixando que grandes ficções e grandes poemas nos interpretem, e não o contrário. A nós, enquanto sujeitos, e à realidade que habitamos, ao mundo de que fazemos parte, ao real.

José Castello

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

mar


Meu coração é um pórtico partido
Dando excessivamente
sobre o mar

Fernando Pessoa

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Do enigma


Dostô in: O idiota. Editora 34, p. 102.

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

das comparações

Comparar uma coisa com outra é esquecer essa coisa. Nenhuma coisa lembra outra se repararmos para ela.

(Alberto Caeiro)

Imagem: André Kertész

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

o belo


Olha, sabe duma coisa que eu aprendi? O segredo do belo está aqui, ó. [...] Na sua cuca, no seu olho que realmente vê, dentro de você. Se você souber olhar as coisas dum jeito mágico, tudo fica mais bonito.

Caio F.

quinta-feira, 31 de julho de 2014


Só se vê nitidamente uma coisa quem não vê nitidamente essa coisa.

Álvaro de Campos

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terça-feira, 29 de julho de 2014


O campo é o lugar onde não estamos.

Bernardo Soares

segunda-feira, 28 de julho de 2014

da literatura

O que a literatura faz é o mesmo que acender um fósforo no campo no meio da noite. Um fósforo não ilumina quase nada, mas nos permite ver quanta escuridão existe ao redor.

William Faulkner


sexta-feira, 25 de julho de 2014

vago

Me parece vago me vestir das tuas palavras, ou te vestir das minhas. Me parece vago eu e tu.

Ana Cristina Cesar in: Poética. Companhia Das Letras, p. 402.

quinta-feira, 24 de julho de 2014

e


(...) ele disse e parou, e eu sabia por que ele tinha parado, era só olhar o seu rosto, mas não olhei, eu também tinha coisas para ver dentro de mim...

Raduan Nassar in: Lavoura arcaica. Companhia das Letras, terceira edição, p. 26.

sexta-feira, 20 de junho de 2014

segunda-feira, 9 de junho de 2014

O bicho homem não faz outra coisa a não ser pensar no amor


Do fundo do coração, ou Love, Love, Love

Sempre acreditei que toda vez que a gente entra numa igreja pela primeira vez, vê uma estrela cadente ou amarra no pulso uma fitinha de Nosso Senhor do Bonfim, pode fazer um pedido. Ou três. Sempre faço. Quando são três, em geral, esqueço dois. Um nunca esqueci. Um sempre pedi: amor. Nunca tinha tido um amor. O quê? Aos 35 anos, agitando desse jeito? Explico: claro que tive dúzias, outro dia tentei contar e me perdi na altura do número cento e trinta e muitos. Mas tudo muito rapidinho, assim, uma hora, um dia, uma semana, um mês, pouco mais. Nunca, digamos, UM ANO. Então quando alguém suspirava e dizia cara estou saindo de um caso de DEZ anos, meus olhos arregalava de pura inveja. Histórias mais compridinhas, claro que rolaram. Maria clara por exemplo, mas a gente morava , eu em Sampa, ela no Rio, amor-ponte-aérea. Caríssimo. Isso, das moças. Dos moços, aquele bailarino amerciano em London, London, quatro/cinco meses. Talvez seis? Numa tarde de compras e roubos em Porto-bello Road me deu de presente um cacto (perfeito!) e me deixou plantado até hoje. Esse amor-de-metrô, último trem entre Hammersmith e Euston. Onde andará? (“Onde andará?” é das perguntas mais tristes que conheço, sinônimo de se perdeu.)

Eis que de tanto pedir, insistir, acender vela, fazer todos os feitiços para Santo Antônio e Oxum e concentrar, rezar, mentalizar, eis que pintou. Ano passa me baixou um encosto de São Francisco de Assis, joguei (literalmente) pela janela quase tudo que tinha, e com duas malas, parti para o Rio. Não queria me prender a nada. Nem a Sampa, bem amada. Numa ida a Porto Alegre, em agosto, deu-se. Explosão: à primeira vista. Tudo o que dissemos, depois de um suspiro de alívio, foi: eu amo você. Pasmem: verdade das verdadeiras. Ousadias do coração que saca, na hora, a intensidade do lance. E não disfarça. Bueno, tinha pintado. Então ta. Romance comme Il faut: dias numa casinha no meio de bosques em Gramado. Depois a volta ao Rio e, como dizia Ana Cristina Cesar (Aninha, Ana C., a bela, que falta você me faz menina fujona!), “amizade nova com o carteiro do Brasil”. Laudas e laudas de cartas de amor, uma por dia, duas por dia, dez por dia. Fotos, poemas, juras interurbanas. Voltei. Nós fomos dos dois pro Rio. Dois meses lá: o amor resistia, mas nenhum estava a fim de pegar no pesado. Então fazer o quê? Dividir quarto de pensão na Lapa, andar de ônibus, comer espiga de milho e misto quente? Nenhum acreditava em teu-amor-e-uma-cabana, também não era preciso teu-amor-e-um-rolls-royce (seria ótimo), mas pelo menos uma vitrolinha para fazer amor ao som do Bolero, de Ravel (amor tem desses lugares-comuns quase inconfessáveis). Voltamos. Verão em Torres. Camas de trinta horas. Passeios. Dunas, praia da Guarita. Filme. A sunga verde de lycra.

De repente uma luzinha vermelha começou, cigarro no escuro, a piscar dentro de mim. Foi no carnaval que passou. Suspeitas: porra, eu me afastei de tudo, de todos, joguei tudo pro alto e só quero esse amor, nada mais me interessa, se esse amor me faltar (pode?) eu só tenho isso, é o único laço que me prende à vida – e se falta, Deus, se faltar o que faço? Noites paranóicas, medo Ritchie. E … se dançar? Aí dançou. Foi dançando. Não sei bem como. Uma tarde peguei nas suas mãos e, bem cruel (punhais: como a gente sabe apunhalar com engenho e arte, crava devagarinho a lâmina, depois revira, dentro da ferida), pedi assim: me olha bem dentro dos meus olhos e me responde à seguinte pergunta: “Você não me ama mais?” Silêncio tão espesso que consegui ouvir o ruído do movimento de rotação da Terra. Feito na novela das seis, eu abri a boca quando ouvi a resposta. Um lento Não. Um claro Não. Um seguro Não. Um límpido Não. Um tranqüilo Não. Um sem dúvida alguma Não. Um afirmativo Não. Repete, pedi. Repetiu. Pede-se não enviar flores, pensei. Fechei a porta. Fiquei só, chovia. Com requintes de autopiedade, limpei devagarinho com feltro um disco da Elis, deitei no chão e ouvi umas cem vezes “Se eu quiser falar com Deus”. Quando já ia abrir o gás, corri ao telefone e pedi ao Zé Márcio Penido em Sampa: socorro. Vem, ele disse. Santo Amigo. Fui, na mesma hora. Me estonteei, vi todos os filmes, todas as peças, revi todos os amigos, ouvi todos os discos, namorei o que deu. Tinha sido NOVE MESES de fidelidade absoluta, nada imposto, o que é pior: supernatural… Fidelidade, no amor-amor, é sempre supernatural. Quando decidi estou-ótimo-fullgás-total-posso-voltar, voltei. The reencontro: quando dei por mim estava dizendo as coisas mais duras e agressivas e cruéis e impiedosas e injustas e ferinas e baixas e grossas que uma pessoa pode dizer à outra. Comecei a me perder pela cidade. Selecionei vinte gatos& gatas mais lindos do pedaço, dez semifinalistas, cinco finalistas, transei todos. Saí sem parar. De bar em bar, telefone tocando sem parar. Explodindo de vitalidade e saúde e sedução: capacidade de superação. Puxa, gente, como sou maravilhoso, como sou maduro e equilibrado, como sei dar a volta por cima, como não sou careta, como sou moderno e liberadérrimo. Aí, desabou. Dez dias. De manhã bem cedo, chegando da vida, percebi uma pequena rachadura na parede externa do edifício. Avançava lentissimamente. Ao meio-dia rachou de alto a baixo. O edifício veio ao chão: em interna, pedi pra mãe, estou infeliz pra caralho. Peguei o pacote de cartas que tinha pedido de volta (fiz absolutamente todos os números, o problema é que a platéia estava vazia: ninguém aplaudiu minha melhor sequencia de sapateado), coloquei os pés de Ogum. E agora, Caio F.? Agora, estou amanhecendo. Ah, me digo, então era assim. Essa coisa, o amor. Já conheço? Já conheço. Mas como é mesmo que se chama? Talvez, sim, anoitecendo, essas luzes penumbrosas são muito parecidas. Não sei muita coisa. Quase nada. Pedi? Levei. Nunca tinha tido um jeito assim, tão forever. Não me diga que vai passar, vai passar, vai passar, vai passar. Não me diga que foi ótimo, o que você queria, a eternidade? Não me peça para não te encher o saco lamuriando. Posso não saber nada do coração das gentes, mas tenho a impressão de que, de tudo, o pior é quando entra a segunda parte da letra de “Atrás da porta”, ali no quando “dei pra maldizer o nosso lar pra sujar teu nome, te humilhar”. Chico Buarque é ótimo para essas coisas. Billie Holiday é ótima pra essas coisas. E Drummond quando ensina que “o amor, caro colega, esse não consola de núncaras”. Aí você saca que toda música, toda letra todo poema, todo filme, toda peça, todo papo, todo romance, tudo e todos o tempo todo, antes, agora e depois, falam disso. Que o que você sente é único & indivisível e é exatamente igual à dor coletiva , da Rocinha a Biarritz. O coro de anjos de Antunes Filho levanta no ar, em triunfo, os corpos mortos de Romeu e Julieta enquanto os Beatles pedem um little help from my friends, e a platéia ainda aplaude e pede bis (o Gonzaguinha também é ótimo pra essas coisas). Meus amigos, abandonados para que eu pudesse mergulhar, voltaram a mil. Tem seus prazeres o fim do amor. Se é patologia, invenção cristã-judaico-ocidental-capitalista, ou maya, ego, se é babaquice, piração, se mudou-através-dos-tempos, puro sexo, carência, medo da morte: não interessa. Tenho certeza que estive lá, naquele terreno. Ele existe.

Por isso falo dele: Joyce e Paula me pediram elucubrações, as minhas são estas. Estou contando a vocês que estou fazendo elucubrações sobre o amor porque provavelmente, de uma outra forma vocês aí que me lêem, talvez com tédio, também estão pensando a mesma coisa. O bicho homem não faz outra coisa a não ser pensar no amor. Até as relações de produção, a luta de classes, a ecologia, o jogo pelo poder: tudo, questão de amor. Formas de amor. Amor é a palavra que inventaram para dar nome ao Sol abstrato em torno do qual giram nossos pequeninos egos ofuscados, entontecidos, ritmados. A vida toda. Mas se me perguntarem o que quero dizer com isso, não tenho resposta. O que quero dizer é justamente o que estou dizendo. Não estou com pena de mim. Tá tudo bem. Tenho tomado banho, cortado as unhas, escovado os dentes, bebido leite. Meu coração continua batendo – taquicárdico, como sempre. Dá licença, Bob Dylan: It’s all right man, I’just bleeding. Tá limpo. Sem ironia. Sem engano. Amanhã, depois, acontece de novo, não fecho nada. Não fechamos nada, continuamos vivos e atrás da felicidade, a próxima vez vai ser ainda quem sabe mais celestial que desta, mais infernal também, pode ser, deixa pintar. Se tiver aprendido lições (amor é pedagógico), até aproveito e não faço tanta besteira. Mas acho que amor não é cursinho pré-vestibular. Ninguém encontra seu nome no listão dos aprovados. A gente só fica assim. Parado olhando a medida do Bonfim no pulso esquerdo, lado do coração e pensando, pois é, vejam só, não me valeu.

* Texto de Caio Fernando Abreu, publicado na extinta revista Around, na década de 80.

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quinta-feira, 29 de maio de 2014


Grégoire Bouillier in: O convidado especial. Cosac Naify, p. 95.

terça-feira, 27 de maio de 2014

do tempo


Doía-me ter de imaginá-las diferentes, pois o tempo que muda os seres não altera as figuras que deles guardamos. Nada é mais triste do que essa oposição entre a decadência das criaturas e a imarcescibilidade das lembranças do que compreendermos não ser de fato mais a mesma quem com tanto viço surge à memória, não nos ser possível, exteriormente, contemplar a que interiormente tão bela nos parece, e que não obstante almejamos rever.

Proust in: O tempo redescoberto. Tradução de Lúcia Miguel Pereira. Ed. Globo, p. 244-245.

Imagem: Leonard Freed

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quarta-feira, 21 de maio de 2014

das lembranças


"Esgotadas as lembranças, já começou a antecipar diálogos, cheiros e sabores com Clarice".

Raphael Montes II in: Dias perfeitos. Companhia das Letras, p. 24.

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quarta-feira, 14 de maio de 2014

fone/fome


Embora eu não acreditasse nos meus ouvidos, ela me ligava de repente depois de todos aqueles anos em que não deu notícia nenhuma, nem sinal, nada, nunca.

Grégoire Bouillier in: O convidado surpresa. Cosac Naify, p. 6.

quarta-feira, 7 de maio de 2014

sábado, 3 de maio de 2014


(...) como se aquele adeus fosse uma despedida como tantas e dia seguinte tornassem a se ver e no entanto nunca mais a verá, a negra antiga e tenebrosa Milão está prestes a capturá-la e devorá-la, ela sumirá no labirinto, por alguns instantes o seu sorriso travesso ficará espelhado na poeta de vidro, depois na convulsiva multidão que se acotovela no corredor o perfil de sua nuca perder-se-á em meio a um distante som de rock, entre ele e Laide haverá uma distância infinita, planícies, mares e montanhas, além da cortina de silêncio e de escuridão. (...) O jogo acabou, é o acerto de contas. As portas que se fecham, a solidão, o vazio, o deserto, os mudos soluços que ninguém ouvirá. Você chegou ao porto, homem idiota, que pensava ser sabe-se lá o quê.

quarta-feira, 30 de abril de 2014

aparece/desaparece


Mas ninguém diria que depois de ter superado o desaparecimento eu não pudesse superar o reaparecimento dela...

Grégoire Bouillier in: O convidado surpresa. Cosac Naify, p. 22.

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Caio F.

terça-feira, 29 de abril de 2014

(...) mas naquele momento fiz de tudo para que ela não percebesse que eu estava dormindo bem no meio da tarde, isso nem pensar, seria como um pecado da minha parte ou uma afronta àquele instante excepcional, ou ela teria pensado algo que eu queria justamente que ela ignorasse e, não, a minha vida não se tornara um sono contínuo e eu não passava o tempo inteiro deitado e jazendo em mim mesmo desde que ela me abandonou; ao contrário, eu vivia uma festa permanente e estava em plena forma e cada instante era um mar de rosas e, ora, o que ela pensava afinal?

Grégoire Bouillier in: O convidado surpresa. Cosac Naify, p. 7.

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quinta-feira, 24 de abril de 2014

quinta-feira, 17 de abril de 2014

"Lembro-me de ter sentido pela primeira vez uma sensação de vazio, como a que sentimos diante de tudo o que foi destruído, cortado rente."

Patrick Modiano in: Dora Bruder. Ed. Rocco, p. 27.

domingo, 13 de abril de 2014

"É impossível escrever mais de uma dezena de cartas de amor sem ficar ansioso por mudar de assunto: Inconscientemente, Leila desejava evitar as repetições tão características do amor, que por fim acabam por arruiná-lo. Queria mater nítida e impecável sua imagem de Mountolive".

(Lawrence Durrel in: O quarteto de Alexandria - Mountolive. Ed. Ediouro: 2006, p. 47)

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sexta-feira, 11 de abril de 2014

visita

me visite sem telefonar um dia desses
como não se faz na alemanha
como não se deveria fazer nunca na alemanha
sob o risco de de chamado
latinos americano de merda
(também conheço essas barras)
mas só quero que você me visite de repente
não mais que
um dia desses
sem avisos

Caio F.

2 e 3 de maio de 1979

sexta-feira, 4 de abril de 2014

coisas bonitas, coisas delicadas, perfeitas


"Dalton queria lhe dizer coisas bonitas, coisas delicadas, perfeitas. Mas tudo estava entalado em sua garganta. Ele pensou com força. Uma coisa bonita. Uma palavra agradável. Por várias vezes tentou falar-lhe. Nasa saía".

(Bolívar Torres in: Não muito. Ed. 7 Letras, p.80)

quinta-feira, 3 de abril de 2014

lembranças

"(...) minhas lembranças são lindas. Poucas. Mas lindas. Inventadas ou plagiadas?
Acho que quando curtimos de fato o momento, o momento é o próprio encanto. A distância transforma os momentos em sensações. Cheiros. Mas quando nada mais subsiste de um passado remoto após a morte das criaturas e a destruição das coisas - sozinhos, mais frágeis, porém mais vivos, mais imateriais, mais persistentes, mais fiéis - a dor e o sabor permanecem ainda por muito tempo, como almas, lembrando, aguardando, esperando, sobre as ruínas de tudo o mais, e suportando sem ceder, em sua gotícula impalpável, o edifício da recordação. Ficção. Literatura. Plágio."

(Jacques Fux in Antiterapias. Ed. KBR)

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quarta-feira, 2 de abril de 2014

Um afastamento

"Mas ela não o procurava há muito tempo. A última vez que se encontraram, havia alguma coisa diferente em seu olhar. Um afastamento. Uma distância que o intrigou. Ela o olhou como um navio abandonado, sem rumo, desaparecendo no horizonte".

(Bolívar Torres in: Não muito. Ed. 7 Letras, p.8)

sexta-feira, 28 de março de 2014

Ligações perigosas


"(...) a verdadeira grandeza dessa arte não reside numa propaganda qualquer do hedonismo mas em sua análise. É essa a razão pela qual considero As ligações perigosas de Choderlos de Laclos um dos maiores romances de todos os tempos.
Seus personagens não se ocupam senão da conquista do prazer. No entanto, pouco a pouco, o leitor compreende que é menos o prazer e mais a conquista que os tenta. Que não é o desejo de prazer mas o desejo da vitória que conduz a dança. Que aquilo que aparece primeiro como um jogo alegre e obsceno se transforma imperceptível e inevitavelmente numa luta de vida e de morte. Mas o que tem em comum a luta com o hedonismo? Epicuro escreveu: "O homem sábio não procura nenhuma atividade ligada à luta."

(Milan Kundera in: A lentidão. Ed. Nova Fronteira, p. 13)

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quinta-feira, 27 de março de 2014

do esquecimento


"Minha mente se ocupava/ com coisas esquecidas".

(Shakespeare in: Macbeth)

quarta-feira, 26 de março de 2014

do que não existe

"A mesma coisa que o eterno: "Você verá quando eu deixar de amá-lo", tão verdadeiro e tão absurdo, pois de fato obteríamos muito se não amássemos mais, porém não nos preocuparíamos em obtê-lo. Exatamente a mesma coisa. Se a mulher que tornamos a ver quando já não a amamos, nos diz tudo, é porque, realmente, não é mais ela, ou não somos mais nós: a pessoa que amava já não existe. Por aí também a morte passou, tornando tudo fácil e tudo inútil."

(Proust in: Em busca do tempo perdido vol. 5 - A Fugitiva. Tradução de Carlos Drummond de Andrade. Ed. Globo, p.145)

Imagem: Blue Valentine

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segunda-feira, 24 de março de 2014

Fica difícil fazer literatura tendo Gil como leitor. Ele lê para desvendar mistérios e faz perguntas capciosas, pensando que cada verso oculta sintomas, segredos biográficos. Não perdoa o hermetismo. Não se confessa os próprios sentimentos.

Ana Cristina Cesar in: Poética. Companhia das Letras, p.50.

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quinta-feira, 20 de março de 2014

Eu fugiria ao combate

"Não estava preparado para nenhum deles. Não havia sido criado para tropeços, fracassos e dificuldades. Não seria como D. Quixote, enfrentando as batalhas, inventando minhas próprias epopéias. Não. Eu fugiria ao combate. Não teria nenhuma honra e virilidade diante da dificuldade. E mais tarde descobri que nem as histórias eram tão simples assim."

(Jacques Fux in: Antiterapias. Ed. KBR)

quinta-feira, 13 de março de 2014

segunda-feira, 10 de março de 2014

da arte


"O maior benefício que devemos ao artista, seja pintor, poeta ou romancista, é o desenvolvimento de nossa empatia [...] A arte é a coisa mais próxima da vida; é um modo de aumentar a experiência e ampliar nosso contato com os semelhantes para além do nosso destino pessoal."

(George Eliot in: The natural history of german life)

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

destemida e doce

“Gostava das pessoas erradas, consumidas pela paixão, admirava São Paulo e Santo Agostinho, acreditava que era preciso se fazer violência para entrar no reino celeste.
Poucas horas antes de morrer, pediu um conhaque e sorriu, destemida e doce, como quem vai partir para o céu. Santificara-se”.

(Paulo Mendes Campos in: Cisne de feltro - crônicas autobiográficas. Crônica: Maria José. Ed. Civilização Brasileira, p. 100)

Das formas breves


“Dizem que Averrós é perigoso de tão pacato. Pede, antes de tomar. Ou não toma, porque sempre lhe dão um pouco, por medo do pior. Verdade que poupa nossa casa e vem só por meu pai, solicita apenas a ele. E agora está solto. Talvez tenha escutado o que me disseram dele, o que já ouvi mais de uma vez.
- Aquilo espuma para dentro. Com pouco pode estourar.”

(Fragmento de "Averrós", conto de Jose Luiz Passos (que eu adorei!), publicado pela coleção Formas Breves)

http://blog.e-galaxia.com.br/formas-breves/

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

...



Ana Cristina Cesar in: Poética. Companhia das Letras, p. 304.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

incapaz de dizer

"(...)essas coisas nunca suspeitadas nos limites da nossa casa" eu quase deixei escapar, mas ainda uma vez achei que teria sido inútil dizer qualquer coisa, na verdade eu me sentia incapaz de dizer fosse o que fosse..."

(Lavoura Arcaica, Raduan Nassar, p. 28, Ed. Companhia das Letras)

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

do descanso


"Eu nunca sei se quero descansar porque estou realmente cansada, ou se quero descansar para "desistir"."

(Carta de Clarice Lispector – Berna, 01/07/46. Extraído de: Minhas queridas – Clarice Lispector, org. Teresa Montero, Ed. Rocco, p. 128)

Imagem: Tony Duran

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terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

dos monstros


Flavio Torres in: Monstros fora do armário. Não Editora, p.84.

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Aventura na casa atarracada


Aventura na casa atarracada

Movido contraditoriamente
por desejo e ironia
não disse mas soltou,
numa noite fria,
aparentemente desalmado;
- Te pego lá na esquina,
na palpitação da jugular,
com soro de verdade e meia,
bem na veia, e cimento armado
para o primeiro a andar.

Ao que ela teria contestado, não,
desconversado, na beira do andaime
ainda a descoberto: - Eu também,
preciso de alguém que só me ame.
Pura preguiça, não se movia nem um passo.
Bem se sabe que ali ela não presta.
E ficaram assim, por mais de hora,
a tomar chá, quase na borda,
olhos nos olhos, e quase testa a testa.

Ana Cristina Cesar in: Poéticas. Companhia das Letras, p. 107.

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Marfim


Ana Cristina Cesar in: Poéticas. Companhia das Letras, p. 84.

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

não


Ana Cristina Cesar in: Poética. Companhia das Letras, p. 64.

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

do instante


(...) a aproximação mútua era sempre o excedente de uma alteridade e o instante do abraço era só inebriante porque não era mais que um instante.

Milan Kundera in: A vida está em outro lugar. Nova Fronteira, p.16-17.

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